Técnica para tratar autista mais cedo traz ganho de QI e comunicação
RACHEL BOTELHO
da Folha de S. Paulo
da Folha de S. Paulo
Um estudo pioneiro da Universidade de Washington publicado nesta terça-feira (1º) na revista "Pediatrics" revela que bebês com transtornos do espectro autista podem ter ganhos de comunicação, de interação social e de QI quando submetidos a uma intervenção intensiva precoce, a partir dos 18 meses de idade.
A pesquisa envolveu 48 crianças com 18 a 30 meses, separadas em dois grupos. Um deles recebeu 20 horas de um tratamento chamado ESDM (Early Start Denver Model) e cinco horas de terapia aplicada pelos pais, por semana. O grupo controle foi encaminhado para terapia em centros comunitários de Seattle (EUA).
Ao fim dos dois anos de estudo, o QI das crianças do grupo submetido ao ESDM subiu, em média, 18 pontos, em comparação a quatro pontos entre as do grupo controle. Sete crianças apresentaram uma melhora global significativa o bastante para que recebessem um diagnóstico mais leve, de distúrbio invasivo do desenvolvimento -no grupo controle, apenas uma chegou a tanto.
Para o psiquiatra Estevão Vadasz, coordenador do Projeto de Autismo do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, apesar de o método ser aplicado há mais de 20 anos em crianças mais velhas, inclusive no Brasil, o trabalho é original ao revelar eficiência em uma faixa etária mais baixa. "Sabe-se que, quanto mais cedo se tem o diagnóstico, melhor, mas ninguém tinha feito um estudo grande assim."
O médico defende que o método seja aplicado [no serviço público] no Brasil "o mais urgente possível". "É muito mais barato investir quando a criança é pequena do que gastar bilhões com adultos e adolescentes, quando não se tem praticamente nada a fazer."
Ana Maria Mello, superintendente da AMA (Associação de Amigos do Autista), também é a favor de tratar cedo. "A intervenção precoce faz toda a diferença. A partir dos dois anos de idade, os resultados já são muito bons", afirma.
Luiz Celso Vilanova, chefe do Departamento de Neurologia Infantil da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), acha a proposta positiva, mas faz uma ressalva. "Se esse método é melhor do que outros, não dá para saber [pelo estudo], mas ele é multidisciplinar, foi elaborado por fisioterapeutas, fonoaudiólogos, pediatras, neurologistas", afirma.
Segundo ele, poucos centros no país atendem o autista de maneira intensiva, como no estudo. Para Vadasz, sua aplicação não é viável na rede pública. "Na particular, custa de R$ 1.000 a R$ 2.500 por mês."
Diagnóstico
Segundo Vilanova, nem sempre é possível, aos 18 meses, diagnosticar o autismo infantil.
"Mas posso colocar no grupo de distúrbio invasivo do desenvolvimento [doenças caracterizadas por dificuldade de interação social e de comunicação e por um repertório restrito de interesses e atividades, como o autismo] quando a criança tem comprometimento de linguagem, de habilidades motoras, comportamentos repetitivos.
Há casos em que dá para saber, mas há outros em que não", diz ele.
O diagnóstico depende ainda do acesso aos serviços de saúde. "Em famílias mais ricas, tenho visto aos dois anos. No SUS, há crianças de cinco anos sem diagnóstico, que terão muito menos ganhos do que se tivessem iniciado o trabalho antes."
Mello afirma conhecer apenas um caso de diagnóstico de criança com menos de dois anos de idade, mas acredita que a tendência é que os médicos detectem a doença cada vez mais cedo, por terem maior acesso à informação.
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